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segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Carta a meu Pai.




Partiste sem me avisar Pai, não cheguei a tempo, não estive contigo nos últimos momentos, e eu queria. Lembras-te em pequeno? Surgias enorme, diante dos meus olhos, e condicionavas as minhas brincadeiras, tinha medo que elas te pudessem enfurecer.

Não raras vezes nos meus terrores nocturnos, sentia a tua mão pesada castigar-me a pele, como consequência de alguma ousadia clandestina…

Vivia-se a década de 60, e eu não fazia ideia de como a vida era difícil, para uma família modesta como a nossa, nem como o teu trabalho tantas vezes pesado te roubava a capacidade para a ternura, nem como vivias por dentro essa escravidão.

Também não sabia que nem sempre são precisos braços, para abraçar…

Lembro-me de pensar, cheio de tristeza que talvez não gostasses de mim, que talvez tivesses preferido que eu fosse menina, que talvez a vida da tua infância te tivesse impedido a aprendizagem do sorriso…

Lembro-me de ter crescido e ver-te envelhecer…

Lembro-me de ter 40 anos de ter um emprego estável e um enorme vazio de ti…

Lembro-me de me deitar à noite e ficar a pensar que um dia, poderia ser tarde de mais para nos dizermos um ao outro a palavra mágica, capaz de desembaraçar os nós do novelo das nossas emoções, contidas a vida toda…

Um dia fui almoçar contigo, lembras-te. Já não me lembro do que falámos, mas à despedida não consegui reprimir o gesto que há anos se encontrava cativo.

Abracei-te com força e no teu ouvido, disse-te; - Gosto muito de ti Pai.

Afagaste a minha cara e disseste baixinho; - Também gosto muito de ti filho.

Pareceu-me um segredo, selámo-lo em silêncio apenas com um sorriso. Depois disso, Pai, as coisas foram demasiado rápidas e partiste quase sem me dar tempo a prepara-me para a tua partida, quando te vi pela última vez na cama do hospital estavas sereno, mas gostava de ter estado contigo no último momento, para te dizer obrigado por tudo pai!

Tento conter a emoção, afinal um Homem não chora, mas apesar de tudo teimosa, a lágrima rola sempre. Sei que um dia destes, ao dobrar um esquina da vida te vou reencontrar e vamos repetir o abraço até cansar Pai, até cansar.

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